segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Maria Luiza Palhas











uso indevido


hora do rush

calçada apinhada
pontos de ônibus
driblam
pontas de estoque
pingos de leite
adoçam
pingos de chuva


FREADA BRUSCA
susto
estrondo de guerra
ricochetes de latas e lutos
viscosidades que se misturam


a arma do crime
sai em disparada

12mai07




pelúcias



falta que faz
a vida que era
da chance
da casa sem tranca
da conta sem mora
dos contos nos cantos


falta que fez
a vida que vem
sem norte
só cortes
só dores
balaços
horrores


nem brinque


12mai07


lágrimas condensadas

“Pudim de Pão”, Asta Vanzodas


quanto doce já fiz
em meio à dor
quanta carne cortei
cheia de angústia
quanta fronha dobrei
chorando a cântaros
quanto ferro passei
a ferro e fogo


ouvi no rádio que
o amor é o melhor tempero

tem peito, essa gente
tem peito


24mar07




jardim perifa

só vim aqui pra dizê

eu tive 4 filho
3 que eu pari e o jorge,
que vivia lá em casa

um foi pro estado zunido
entregá essas coisa de delíver
um dia encheram ele de pancada disseram
só recebi um relógio quebrado

outro foi de bala perdida
tava trabalhano
como é que uma coisinha daquela
arrebenta com a cara de um
beijá aquela massa cor de sangue
só mãe pra tê estômago

nem bem parei de chorá
e vejo o otro escondendo um pacotinho
é do jorge mãe
mamou no meu peito dormiu no meu colo não podia me vê
que se agarrava na minha saia

jorge são jorge
virou a cabeça virou justiceiro virou traficante

forçô meu menino
a escondê muamba

sou mansa sou calma mas tudo tem limite peguei
joguei tudo no vaso
duas descarga
meu filho: tô morto
que morto que nada
então não valeu os banho
que dei
feijão de são benedito
cada fome uma concha
então não valeu
as história
os cuidado tô morto num dô dois dia
dois dia
entra 3 capuzado
bestêra conheço eles tudo
o jorge fuziu eu pulo na frente me voa no chão
saco imprestávi
lixo nojento

então esse foi de bala achada
ele nem pediu nem rezou
ficava me olhando
do caxão
com jeito de filho
com jeito de perdão

arrebentei o vaso
a machado custei tanto pra ter e não serviu pra nada


só vim aqui pra dizê
comprei otro
rosa nem gosto dessa cor

também comprei uma arma até que é fácil
robá um pacote

mandei recado
tô aqui sentada esperano
meu coração escuta mais
que meu zovido

ele entra
eu viro o pacote
e dô a descarga


só vim aqui pra dizê
já tô chegano meus filho

27mai07





- Maria Luiza Palhas é tradutora, dramaturga e poeta. Tem incursões na Dramaturgia com ênfase na chamada Literatura de Audioficção (textos dramatúrgicos roteirizados para suporte de áudio); traduções poéticas e poemas publicados no site ‘Cronópios’. Seu primeiro livro de poesia ‘Rompantes’ está em fase de revisão.


* O uso que os seus poemas fazem do espaço não pode ser reconstituído nesse blog.


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