domingo, 12 de agosto de 2007

Zéfiro

Texto de Cecilia Furquim
Ilustrações (da Internet): Francesco Sgroi
Para Gabriela













Minha mãe me disse
que na velha Grécia
tinha um tal de Zéfiro,
que levava gente
suave, mansinho,
de um lado pro outro

Nos seus longos braços,
seu colo de vento,
você nem sentia:
já tinha chegado






















Eu bem que pensei:
será que é possível
chamar esse Zé
pras bandas de cá?

Na cama, de noite,
encostei o corpo
no meu travesseiro
e contei pra ele
meu louco desejo:































Seu Zéfiro, ouve:
pega uma carona
em boa corrente
e vem pro Brasil.

Me leva pro alto,
eu quero planar
no imenso do céu,
poder ver a lua
e dar oi pro sol,
escapar da chuva
desviar dos montes,
depois pegar onda
na estrela cadente.

























No dia seguinte,
esperei pra valer,
mas ele não veio
aqui me pegar.

Pensei que talvez
desejo de um só
não fosse bastante,
tão longa viagem
não vai compensar.
























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.
.
.
Liguei pra vovó,
e disse pra ela
também desejar:

Seu Zéfiro leva,
me leva pra era
dos meus ancestrais.
Me mostra a fazenda
e a grande família,
unida na mesa,
contando sua lida.
























.
.
.
.
Me põe já num galho,
com a mão lotada
de jabuticaba.

Depois, com a moçada
treinando a paquera
no footing da praça.

E em hora escura,
me põe a girar
no centro da pista
do baile de gala.
























Chamei a babá
e disse pra ela
também desejar:

Seu Zéfiro leva,
me leva pra terra,
e traz o meu homem,
o filho da Dita,
meu Zé violeiro.

Vem Zéfiro, zela
pela nossa sorte,
pra terra nos dá
tudo que se come.

Sussurra baixinho
meu tanto de amor,
traz ele pra junto,
pra gente gozá
o sabor da vida
e o som da viola.

























.
.
.
Depois à noitinha
falei pro papai
também desejar:

Seu Zéfiro leva,
me leva pro palco,
me tira da roda
de fazer dinheiro

Coloca minha voz
num bom microfone,
e todos amigos,
ligados, curtindo
a banda de rock.

Me deita na rede
no fim de semana,
rezando umas graças
e fazendo troças
pras saias da casa.























.
.
.
.
.
Faltava então
falar com a mamãe.
Agora é sua vez:
com o seu desejo
ele não tem jeito
de negar a todos:

Seu Zéfiro, leva
me leva pra um ponto
um ponto de luz
em fala ou em letra
que sirva pro povo
melhor entender
o seu desnorteio
e ajude a tomar
um caminho novo

Seu Zéfiro, lança
a tua aragem
em minha linguagem
e eu possa com isso
formar uma trança
que enlace os sentidos
nos fios da razão.
















E assim esperamos
o vento do oeste
soprar nossa sede,
suave, mansinho.

Suave, mansinho,
não dá pra contar
o tempo do Zéfiro.

Em colo de vento
a gente nem sente
o seu movimento.

Balança de um jeito
gentil, delicado,
eu mal me dei conta
que fui transportado.












FIM