sábado, 12 de março de 2016

A Baratinha do Mar




Poema de Cecilia Furquim
(ilustrações da autora)


A baratinha do mar
tinha prima na cidade
que teve a boa vontade
de economizar dinheiro,
e também a felicidade
de colocar no cabelo
uma fita bem bonita.


Veio então aquele monte
de bicho pretendente,
mas escolheu Don Ratão
que morreu no caldeirão.

Essa dona baratinha
com uma fita no cabelo
e dinheiro na caixinha
virou viúva bem cedo,
antes mesmo de casar.



Já a baratinha do mar,
essa daí não tinha
nem fita no cabelo
nem um pouco de dinheiro.

Ela morava na pedra
de lá da ponta da praia,
bem do lado do siri.
E quando seres humanos
passeavam por ali;
elas corriam pro lado,
escutando o comentário:

“Olha, é barata do mar!
Não é preciso correr,
elas são muito mais limpas
e também são menorzinhas,
mas a feiúra é igual”






A barata não achava
vantagem, afinal,
pequenez e limpeza,
sendo pobre e sendo feia.

“Quem comigo irá casar?
Se eu ao menos costurasse
um laço pra disfarçar.”

Ela então teve uma idéia:
pediu pras algas do mar
ofertarem um pedaço
para então fazer um laço.
Mas, separado da pedra,
o laço cheirava mal
e ninguém chegava perto.
Foi aí que ela encontrou
uma moeda real.


  

Espalhou-se pelo mar
a notícia da riqueza.
Os peixes se aproximaram
e disseram com franqueza:

“A moeda é dourada,
só que não vale nada.
Tem igual uma centena
nos navios naufragados,
e não compram nem minhoca.”




A baratinha do mar
ficou  bem desconsolada.
Suspirou pro Deus das águas,
olhando as ondas na praia
batendo leve na pedra:

“Quando é que um ser marinho
Virá me fazer carinho?”
  

Fez, enquanto esperava,
um tricô de algas velhas
do tamanho da  praia.
Apesar de ser tão belo
acabou meio fedido.



Mas aí veio um mendigo
que, por nunca implicar
com essas questões de olfato,
julgou o tricô de algas
uma obra prima de fato.



Esse mendigo crustáceo
tinha certa excelência.
Surgiu então a crença
de ser nobre disfarçado,
mas era mendigo mesmo,
vivia de pedir esmola.

E não é que ele de cara
achou a nossa barata
a mais bela do mar,
e com ela quis casar?

Ou estava acostumado
a só ver coisa feiosa
ou sofria de miopia.

E como nunca na vida
teve posses, ouro ou prata;
não sentiu falta de nada.

  

A baratinha do mar
hoje escreveu uma carta
pra prima baratinha
que tem fita no cabelo
e dinheiro na caixinha:

“Pros humanos nossa vida
por certo seria sofrida.
Mas como sou barata,
fica mais fácil - ela diz -
vivo sim muito feliz.”







FIM






Escrito e ilustrado por volta de 2008/2009